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domingo, 16 de junho de 2013


 Ah, se aqui fosse o Japão...

            Nenhuma greve é boa. É a manifestação de descontentamento de uma classe de trabalhadores, é também o sintoma de que algo não vai bem com a sociedade. Há quem ainda se lembre, num país de poucas memórias, da greve dos caminhoneiros. Esse fato acarretou prejuízos, lacunas quanto ao abastecimento de produtos e de gêneros alimentícios nos mercados, criou muitas dificuldades para a população em geral, e, trouxe prejuízos materiais significativos.
            A greve do magistério público não é diferente, seus efeitos nocivos serão percebidos a longo prazo, e, provavelmente, não se refletirão diretamente na economia, mas na capacitação e no desenvolvimento dos educandos da rede pública de ensino. Para algumas mães, que a partir dessa decisão, passarão a conviver mais com seus filhos, há dificuldades em planejar atividades de lazer que preencham o espaço vazio, resultado da falta da rotina escolar.
            Frente a isso, circula um discurso bastante comum entre muitos pais, que é o que diz respeito aos salários dos professores: “eles sabiam que ganhariam pouco, quando optaram por fazer seus cursos universitários direcionados à docência.” Outros acreditam: “os professores choram de barriga cheia”. Para nós, pessoas comprometidas com a família, com a escola, com a educação, estas são afirmações injustas e que depreciam o trabalho honrado do professor. Temos ainda que ouvir esse tipo de comentário, que representa a fala de quem não tem noção do valor real da educação, ou seja, que vai além da questão que envolve o salário.
Vivemos num país no qual a corrupção anda de rédea solta, onde meninos vendem drogas na periferia das grandes cidades, quando não o próprio corpo, onde muitas famílias perderam o rumo de seus valores e não sabendo o que fazer com seus filhos. Muitos terminam delegando aos professores o ônus dessa tarefa. Com tudo isso, como é possível compreender o slogan: “EDUCAR É TUDO”, lançado pela RBS? Há algum tempo, quando a televisão e os jornais nos chamam atenção todos os dias para  exemplos de falcatruas, lavagem de dinheiro e corrupção, inclusive de menores, que são investigadas cotidianamente no país.
Vejamos então o exemplo do Japão, “um pequeno gigante” que detém a 2ª maior economia do mundo, foi dizimado ao longo da II Guerra Mundial, e, ainda ‘por cima’, é menor que o Rio Grande do Sul e Santa Catarina juntos. E, que apesar disso, tornou-se uma potência, por ter como base fundamental, principalmente, a educação, a família e o respeito ao idoso. Essa é a fórmula que fez da Terra do Sol Nascente uma vencedora. Isto porque para os japoneses “a célula familiar é a base para uma nação forte.”[1]
No Japão, a população tem acesso gratuito às escolas públicas desde 1872 e pais que não mandam seus filhos para a escola vão para a prisão. Os idosos são respeitados por terem mais experiência, mais sabedoria, capacidade de compreender e de perdoar, são considerados os benfeitores da sociedade. (ZH 19/03/06. p. 49). Tais valores estão se perdendo em nossa sociedade ocidental.
            Além disso, os japoneses têm um perfil disciplinado e objetivo o que favorece também o sucesso de seus propósitos. Diferentemente das condições de trabalho do professor no Japão, as do professor brasileiro são aterradoras, pois há uma inversão de valores. O docente brasileiro lembra por analogia o “libertus”, que na antiguidade, era o escravo grego responsável pela educação dos filhos dos cidadãos romanos, enquanto no Japão o professor é o único profissional ao qual a rainha se curva.   
Não menos importante, é o conteúdo de uma reportagem de uma página do jornal Correio do Povo de 02/07/03. Nesta, foram divulgados resultados do relatório da Organização para Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e da Organização das Nações Unidas para a Educação à ciência e à Cultura (UNESCO). O estudo analisou o rendimento escolar de jovens de 15 anos de idade da Educação Básica de 41 países. Na prova realizada em leitura, o Brasil ficou na 37ª posição. Essa avaliação mostra que os alunos demonstram uma mínima compreensão e interpretação na leitura de textos. Demonstra ainda, que esses educandos não decifram o texto escrito e apresentam um déficit em leitura.
O que fazer? Num país em que os professores são, via de regra, mal remunerados e por isso, precisam, às vezes, trabalhar 60h para poder manter suas famílias com alguma dignidade. O que fazer com um salário baixo que não dá ao profissional a oportunidade de realizar cursos, especializar-se?
É hora de dar apoio, de reverter o quadro. Mais do que nunca um antigo chavão tem em seu conteúdo a posição que todos deveriam tomar: “a união faz a força.”
Professores, mostrem a que vieram. Vieram sim, para qualificar progressivamente o seu trabalho, para trabalhar com seriedade com o propósito de fazer o melhor que puderem. Vieram para serem respeitados e valorizados, vieram para que seu trabalho com jovens, adultos e crianças finalmente seja prestigiado e acredita-se nisso. Porque vocês querem as salas de aula cheias novamente e também para poder observar o crescimento intelectual e de maturidade de cada educando. Os professores esperam que seus alunos pensem na escola como o lugar que foi feito para eles e por eles. Querem trabalhar com entusiasmo, mas querem sentir-se valorizados e não simplesmente terem que questionar sobre qual é o espaço e o valor da Educação, num país que não valoriza seus professores. A grande dúvida é como reverter este quadro?
Se a greve ou sua ameaça representa apenas parte de uma questão antiga que envolve a desvalorização do profissional da educação, então resta a toda a sociedade refletir sobre o papel da família, da escola, do poder público e da sociedade como um todo. Resta lutar e esperar que cada segmento cumpra o seu papel e se comprometa com o futuro das novas gerações. Já que esta reflexão é importante para que a população, de modo geral, a exemplo dos japoneses, compreenda o valor de suas ações e de sua participação nessas questões, na medida em que possa comprometer-se com o que cabe a cada um, como responsável nesse processo.






Autoria: Ana Lúcia Pacheco de Souza



[1] Fragmento de texto extraído do jornal Zero Hora do dia 19-03-06.